CORAGEM.

 -E então, você vai fazer?
-Sei não...
-Deixa de ser frouxo, tô com a arma ali no carro, estacionei na rua de trás.
-O que eu ganho com isso?
-Te dô uma grana, e mais o que tu quiser na cama.
-Eu tenho emprego. E você já faz o que quero na cama.
-Faço mais.
-Tem uma coisa que eu sempre quis que fizessem.
-Fala, eu faço.
-Faz nada, nenhuma teve coragem.
-Se você fizer a tua parte eu faço sim, o que é?
-Nãm, nenhuma teve coragem.
-Eu faço.
-Conversa.
-Verdade, juro. Diz o que é.
-Você é uma mentirosa.
Nisso dou um tapa na cara dela. Faz barulho e ela se treme toda, bate com o corpo no copo, na garrafa, derrama cerveja. O bar inteiro olha. São sete caras e mais duas donas que estão acostumados com tudo, mas sempre reparam, nunca perdem.
-Seu filho da puta – ela diz. Está com raiva, os olhos arregalados, ódio puro. – Você não devia me tratar assim, você não pode.
-Ah, cala a boca. Deixa de drama, você tá acostumada com isso, leva do teu marido, por isso quer que eu mate o sujeito, já deve tá acostumada.
-Seu veado de merda. Tu num pode me tratar assim. Ele é meu marido, você é só um qualquer pra quem eu dô.
-Cala a boca.
-Eu vou te matar, seu merda.
-Besteira.
-Eu vou te matar.
-Se você tem tanta coragem pra me matar, então porque não vai lá e mata primeiro o corno do teu marido?! Besteira, você num tem coragem de nada.
E dou outro tapa. Ela levanta me olhando, o ódio puro lá, vai ser difícil dissipar. Caminha pra saída, de costas pra rua, me olhando fixamente. Fico sentado bebendo e fumando. Minutos depois é que a vontade bate. Levanto e vou ao banheiro. Abro a porta e entro. Fede muito. Mijo e merda. E mesmo assim levanto a tampa. Um trabalho bem feito. Olhando assim parece que existem três camadas. De pessoas diferentes? Abaixo a tampa sabendo que nem deveria ter levantado, quando se entra em banheiro de lugar como esse, se a tampa estiver abaixada é porque tem merda e não deram a descarga. Puxo a corda. Sem água. Que lugar de bosta! O pior é que agora não posso deixar pra lá, já enviei a mensagem que minha merda sairia, não dá pra enviar outra dizendo que agora fique guardada. Vou ao banheiro feminino. Olho se não tem ninguém, entro. A tampa levantada. Um balde com água ao lado. Sento e faço o serviço. A merda vai descendo mole. Depois me limpo e derramo o balde. O fedor sobe. Volto pra mesa. Peço mais uma cerveja. E é depois que o cara deixa na mesa que ela entra de novo no bar. Segurando a arma.
 -Seu filho da puta.
Ela diz. Nisso levanta o braço e começa a atirar. Me jogo na mesa derrubando copo, garrafas e bebida. Tento me proteger com os braços cobrindo a cabeça como se isso fosse resolver algo. Os barulhos são rápidos e logo acabam. Ela manda um tambor inteiro e nenhuma acertou em mim. Milagre, pode ser.
Logo depois todos saem correndo. Nenhum ferido. Essa louca poderia ter me matado ou qualquer pessoa neste lugar. Todos saem correndo, inclusive o dono.
Ela continua me olhando com o braço erguido. Depois o abaixa. Ódio pra caralho. Então ela dá de costas e vai embora.
Acreditei que ela não tivesse coragem de fazer algo assim, já que tinha me pedido pra dar fim no marido dela. Acreditei que não teria coragem de matar ninguém. Mas estava enganado, ela só não tem coragem é de matar ele.
Levanto ainda com o coração aos pulos. Saio do bar sem pagar, só continuo andando. Pelo menos ela serviu pra algo. Caminho pensando que poderia estar morto. E que foi uma decisão sábia não ter esperado muito pra ir ao banheiro.

16/11/11 - 02:54


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